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Ortorexia: quando ser saudável demais torna-se um transtorno

Considerado novo, este distúrbio alimentar é caracterizado por uma obsessão por comer saudável. Entenda o que é e confira o depoimento da artesã paulistana Amanda Yîara Guarani, que relata sua superação após uma fase obcecada por um estilo de vida natureba que quase a levou a doenças mais graves

Você já pensou que ser saudável demais pode ter consequências terríveis? Quando os hábitos se tornam excessivos e passam a linha do equilíbrio, ganham o status de transtorno. E tem nome: ortorexia nervosa. Segundo a Sociedade Brasileira de Nutrologia, este é um novo distúrbio do comportamento alimentar caracterizado por uma obsessão para comer saudável.

O termo (do grego, ortho: correto; orexis: apetite) foi criado pelo médico americano Steven Bratman, autor do livro Health Food Junkies (Viciados em comida saudável) e, embora não tenha sido reconhecido como diagnóstico no manual de psiquiatria, apresenta atualmente mais de 30 trabalhos científicos.

Segundo a nutróloga Maria Del Rosario, professora da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo (FCMSCSP), alguns sinais de alerta em pessoas com ortorexia nervosa são: rigidez, comer sem prazer, isolamento (afastam-se socialmente e em função da sua dieta saudável), déficit de nutrientes (queda do cabelo, unhas quebradiças, déficit de memória e concentração, confusão, desmaios) e finalmente, emagrecimento excessivo.

(Ilustração originalmente publicada no La Nacion)


{LIMITE} Mas não pense que o distúrbio está relacionado simplesmente ao hábito disciplinado de ser saudável. Disciplina na alimentação faz bem, e o diagnóstico deve ser realizado por um médico, que precisa avaliar  se existem comorbidades físicas e/ou psiquiátricas (ansiedade social ou transtorno obsessivo compulsivo, por exemplo). Diante de alguma suspeita, o profissional faz a avaliação do estado nutrológico e uma investigação de acordo com o observado durante a consulta (possíveis problemas cognitivos devido a déficit de nutrientes que podem agravar a confusão com os alimentos e dores ósseas localizadas na região lombar, por exemplo).

{RELATO} O limite, como no caso de muitos outros distúrbios, pode ser silencioso. A doula e artesã paulistana  *Amanda Yîara Guarani, 22 anos, relata como foi passar pelo transtorno na ortorexia:

(Fotos: arquivo pessoal da personagem)


Dois mil e dezesseis foi um ano de muita luta e superação pra mim. Foi o ano em que eu superei um transtorno alimentar. Eu sempre tive problemas pra ganhar e manter peso. Seja pela minha constituição física, seja por causa da ansiedade e da depressão. Mas foi no final de 2012, por querer a aceitação e aprovação da pessoa que eu amava, que eu mergulhei em ideias radicais.

Eu fiquei vislumbrada por ideias de naturalismo, veganismo, crudivorismo, e fui incentivada a fazer várias mudanças radicais na minha vida e a seguir muitas regras pra ser uma pessoa “pura” e “correta”. No começo tudo parecia muito legal, saudável, mas eu não percebia que aquilo tinha virado uma obsessão e que estávamos nos destruindo.

Esse transtorno, que está atingindo milhares de pessoas nos últimos anos (inclusive vários conhecidos meus), se chama ortorexia. É diferente de anorexia ou bulimia, porque o foco da pessoa ortorexa não é emagrecer e se sentir bonita, a ortorexia é uma obsessão por uma alimentação pura e saudável, de forma que a pessoa vai restringindo cada vez mais a alimentação, até que a saúde começa a ficar visivelmente comprometida.

A pessoa não enxerga e se agarra a todo custo a filosofias e discursos prontos que justificam o transtorno.

Na primeira foto, em abril de 2013, eu estava com 40kg – havia perdido mais de 10kg em cerca de seis meses. E o que eu ouvi foi “isso é normal, você precisava mesmo se desintoxicar”. Até aí eu ignorei os fatos, preferi confiar na pessoa que eu amava a ouvir minha família. Eu só percebi que estava doente quando meu filho nasceu. Depois do parto em diante eu não consegui mais sair da cama pra quase nada. Me sentia extremamente fraca, tinha a sensação de que a morte me rondava.

Graças ao milagre da Mãe Natureza eu consegui produzir muito leite e amamentar meu bebê por quase 1 ano. Mas foi absurdamente difícil pra mim sobreviver a esse processo. Na 2ª, 3ª e 4ª fotos, eu estava com 37kg, chorava sempre que me via no espelho. Foi então em dezembro de 2015 que eu finalmente aceitei a ajuda da minha família. Voltei para São Paulo e busquei tratamento.

Eu entrei para o PROATA (Programa de Atenção a Transtornos Alimentares) da Unifesp, um tratamento multidisciplinar com psiquiatras, psicólogos, nutricionistas, nutrólogos… Voltei a comer itens que eu deixará de consumir, mas de forma bem equilibrada. As ultimas fotos são recentes. Já ganhei 11k esse ano e estou muito feliz e orgulhosa!

{ALERTA} É importante enfatizar, aliás, que o cyberbullying, a pressão inadequada de algumas mídias sociais e finalmente os comportamentos alimentares de risco são os principais fatores que influenciam o surgimento do problema, viu?! Pense, por exemplo, quando uma pessoa é hostilizada porque posta, em um perfil na rede social, seus hábitos alimentares. Menos julgamento. E mais empatia!

A ortorexia define, especificamente, o distúrbio ligado à alimentação, mas também alerta que o mesmo pode acontecer com excesso de zelo com a beleza de maneira geral, seja com exercícios ou cosméticos.  Equilíbrio sempre!

*Amanda Yîara Guarani é doula e artesã da Azíndia. Seu relato é uma forma de compartilhar e alertar sobre a ortorexia | @amandayiaraguarani

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